Torcer para o time mais fraco é um esporte nacional – imagino que
também mundial. Quando nosso time não está em campo, torcemos para o
Madureira contra o Flamengo, para o Noroeste de Bauru contra o
Corinthians, para o Boa Esporte contra o Cruzeiro. Madureira, Noroeste,
Boa Esporte – times simpáticos, com jogadores que parecem aquelas
figuraças com quem bebemos cerveja e jogamos futebol society. Da mesma
forma, imagino que, quando seus times não estão em campo, os ingleses
torcem para o Queens Park Rangers contra o Liverpool, os espanhóis para o
Levante contra o Real Madrid, e os argentinos preferem o Arsenal de
Sarandi, onde brilha o atacante de duplo sentido Milton Caraglio, ao
Boca ou ao River. Isso vale também para a Copa do Mundo. Quem não vibrou
com a simpática Costa Rica detonando os gigantes Itália e Uruguai, ou
não sofreu com a simpática Costa do Marfim, que perdeu a classificação
para a Grécia no último minuto?
>> Mais notícias sobre a Copa do Mundo
A
Copa do Mundo
continua. Para qual time simpático iremos torcer agora? Uma dica. O
Brasil enfrenta a Colômbia nas quartas de final. Se vencer, deve pegar
França ou Alemanha. Passando, os mais prováveis adversários numa
hipotética final seriam Argentina ou Holanda. Essas cinco equipes –
Colômbia, França, Alemanha, Argentina ou Holanda – têm algo em comum.
Todas são melhores que o Brasil. Têm melhor campanha, melhores
jogadores, padrão de jogo mais definido. Colômbia, Holanda e Argentina
têm os três melhores retrospectos da Copa, contabilizando apenas
vitórias. A Alemanha apresenta o futebol mais bonito. E a França
surpreendeu a todos com um ataque técnico e veloz, comandado pelo craque
Karim Benzema. Depois do que
apresentou contra o Chile, o Brasil, contra qualquer um desses times, representa a zebra em pijama verde e amarelo.
Nosso escrete tem outra coisa em comum com Madureira, Noroeste ou Boa
Esporte. Temos um time simpático, raçudo e patriota. Longe de heróis
nacionais, nossos jogadores parecem os tais amigos de cerveja e futebol
society. Nosso craque, Neymar, chora com o hino. Nosso goleiro, Julio
Cesar, chora antes e depois de bater pênaltis. Nosso capitão, Thiago
Silva, chora o tempo todo. Hulk se esforça como um remador de Ben Hur,
embora seu barco muitas vezes não saia do lugar. David Luiz dá chutões
desesperados imaginando que faz lançamentos milimétricos – sabe que, num
time sem meio campo, esses passes longos às vezes são a única
alternativa. E Fred – bem, Fred é o mais engraçado de todos, o campeão
dos memes no Facebook. Todos figuraças.
>> Nos pênaltis, Julio César cresce e Brasil elimina Chile
Quando se trata de futebol, o brasileiro costuma pecar pela arrogância.
Só aqui um terceiro ou quarto lugar não é considerado uma grande
colocação numa Copa do Mundo. Somos binários – qualquer coisa que não
seja o título é considerado uma derrota. Equipes excelentes, como a de
1950 e a de 1998, e que conquistaram brilhantes vice-campeonatos, são
execradas como perdedoras. A verdade é que o Brasil foi abençoado com
cinco ou seis gerações de supercraques ao longo da história. A de
Zizinho, Ademir e Bauer, em 1950. A de Pelé, Garrincha, Didi e Nilton
Santos, em 1958 e 1962. A de Tostão, Gérson, Rivelino e novamente Pelé,
em 1970. A de Zico e Sócrates, em 1982 e 1986. E a mais recente, a dos
quatro “R”s – Ronaldo, Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos” – se
estendeu, com alguns “R”s a mais ou a menos, por três copas, 1998, 2002
e 2006.
>> "É Julio César, é Julio César"
Hoje o Brasil vive uma entressafra. Temos um supercraque, Neymar – que,
suspeito, seja o melhor jogador surgido no Brasil desde Pelé, e ele
terá três ou quatro copas pela frente para mostrar isso. Para além de
Neymar, nossas figuraças vibram e choram pelo time, e dão o melhor que
têm em cada jogo. Mas, na soma, não formam um time tão forte quanto a
Argentina de Messi e Di Maria, a Colômbia de James e Cuadrado, a Holanda
de Robben e Van Persie, e França de Evra e Benzema, ou a Superalemanha
de Schweisteiger, Ozil, Khedira, Thomas Muller, Neuer, Lahm, Mario
Goetze...
A partir do jogo contra a Colômbia, somos a zebra. Talvez pensar assim
seja, além de mais realista, mais divertido. É bom torcer para o
Madureira. Contra times mais fortes, as vitórias têm sabor especial. Os
franceses perceberam isso em 1998, ao fazer piada com a dificuldade que o
time nacional tinha para superar os adversários nos mata-matas.
Marchavam sob o Arco do Triunfo cantando
“I Will Survive”,
de Gloria Gaynor. Talvez este seja o melhor hino para a reta final da
seleção – mais do que o Ouviram do Ipiranga que leva os jogadores às
lágrimas. Isso, claro, se der zebra contra a Colômbia – e sobrevivermos.