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2 de novembro de 2014

A primeira proposta de Dilma depois de reeleita já enfrenta resistência no Congresso

Dilma teve a primeira lição depois de reeleita. Não dá para falar em diálogo e defender um plebiscito sobre reforma política sem ouvir o Congresso

LEANDRO LOYOLA COM MURILO RAMOS
SEM DIÁLOGO A presidente Dilma discursa em Brasília, horas depois  de reeleita.  A proposta de reforma política por plebiscito agradou à militância,  mas  provocou  o Congresso (Foto: Ricardo Botelho/Brazil Photo Press/Folhapress)
A presidente Dilma Rousseff estava na metade de seu discurso da vitória, na noite do domingo, e já repetira quatro vezes a palavra “diálogo”. Numa construção retórica típica do “dilmês”, disse: “Esta presidente está disposta ao diálogo, e esse é meu primeiro compromisso no segundo mandato: o diálogo”. Dilma apelava à conciliação após uma vitória apertada numa disputa eleitoral agressiva. Rouca e com um microfone ruim, que reproduzia sua voz abafada, num volume baixo, ela padecia por não conseguir ordenar que a militância, incontrolavelmente empolgada, fizesse silêncio. Foi quando sacou o compromisso com a reforma política, o receituário preferido do PT para os momentos difíceis – o mesmo adotado pelo governo depois das ruidosas manifestações de junho de 2013. “Meu compromisso, como ficou claro durante toda a campanha, é deflagrar essa reforma. Que deve ser realizada por meio de uma consulta popular. Como instrumento dessa consulta, o plebiscito, vamos encontrar a força e a legitimidade exigidas neste momento de transformação para levarmos à frente a reforma política. Quero discutir profundamente esse tema com todo o Congresso e toda a sociedade brasileira.” Foi interrompida por aplausos e por gritinhos de “Uhuuu!!!”.
A plateia partidária estava ganha. O Congresso mostrou-se bem menos receptivo ao discurso de Dilma. Dois dias depois veio o troco. Irritados com a iniciativa do plebiscito, os deputados, alguns deles amargurados com derrotas nas urnas, na primeira votação pós-eleição, anularam os efeitos de um decreto presidencial que cria conselhos populares com autonomia para interferir em decisões de órgãos do governo. O Senado avisou que confirmará a decisão. Em seguida, a Comissão de Agricultura aprovou as convocações dos ministros Neri Geller, da Agricultura, e Edison Lobão, de Minas e Energia, para prestar esclarecimentos, apenas com a intenção de criar constrangimentos a eles e a Dilma. Foi a maneira como os parlamentares, principalmente do PMDB da Câmara, mostraram a Dilma que ela não terá trégua após a reeleição, principalmente se mantiver os métodos de governo usados até agora.
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Para anunciar um diálogo, é preciso dialogar antes – e Dilma esqueceu-se de fazer o que pregara no discurso. Depois, até tentou suavizar sua proposta de plebiscito. Mas o Palácio do Planalto não se esforçou para que qualquer um de seus líderes ou representantes no Congresso explicasse a aliados e adversários a ideia do plebiscito. Não deu também nenhum sinal de parceria na reforma política e em outros assuntos. “Não fomos procurados. Não teve diálogo até agora”, diz o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ). “Acontece que a presidente não tem carência; a carência serviu para o primeiro governo dela. O segundo governo dela mal começou e já sofre de envelhecimento precoce. Espera-se dela que dialogue em vez de falar em diálogo.”

Cunha é pré-candidato à presidência da Câmara, na eleição que acontecerá em fevereiro. Na semana passada, o PMDB aproveitou a omissão do governo e o discurso de Dilma para recomendar Cunha como opção à presidência da Câmara contra um candidato do PT. O objetivo é resistir a Dilma. Cunha controla uma bancada particular e tem bons contatos com a oposição. No ano passado, ajudou a criar e consolidar o Blocão, um grupo formado por parte da bancada de apoio ao governo e por parlamentares de oposição. O Blocão travou o andamento do Congresso e criou condições para a criação de duas CPIs para investigar a Petrobras. No enfrentamento com o governo, Cunha irritou Dilma, a ponto de ela recusar-se a recebê-lo.
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Mesmo com muita conversa, seria difícil para Dilma convencer o Congresso de suas boas intenções com o plebiscito. Uma reforma política é importante. Mas a ideia de fazê-la pelo plebiscito é uma forma de o governo se aproveitar da baixa popularidade dos políticos, em especial dos parlamentares, para angariar apoio na sociedade. Os parlamentares não gostam nem um pouco da ideia de tentar mudar as regras que regem suas vidas por uma via em que eles terão menos chances de palpitar. Dilma já tentara a proposta do plebiscito no ano passado, após as manifestações de junho. Na ocasião, ela foi enterrada pelo Congresso sem cerimônia. A indisposição com a ideia é grande porque Dilma nunca demonstrou vontade, disposição, habilidade e simpatia para fazer o que prometeu no palanque da vitória: o diálogo com o Congresso e os políticos em geral.

NA FRENTE O deputado Eduardo Cunha em reunião do PMDB. Seu partido aproveitou vacilo do governo para lançá-lo candidato à presidência  da Câmara (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
Para o governo, as derrotas da semana passada se resumiram a uma questão menor: vingança pós-eleitoral. “Ali, senti birra, revolta, vingança. Perderam as eleições, né?”, disse o líder do PT na Câmara, deputado Vicentinho (SP), sobre a derrubada do decreto que instituía os conselhos populares. Esse tipo de raciocínio simplório explica boa parte dos dissabores do governo Dilma no Parlamento, apesar de ele ter contado, em tese, com a maior base de apoio da história. As complicações tendem a aumentar com o início da nova legislatura, em 2015. O número de partidos cresceu de 22 para 28. Isso provavelmente tornará as negociações com o Congresso mais árduas para o Palácio do Planalto. Apesar de o governo ter, no papel, maioria tanto na Câmara (mais de 300 dos 513 deputados) quanto no Senado (mais de 60 dos 81 senadores), a oposição estará mais forte. O candidato derrotado na eleição presidencial, Aécio Neves, atuará dentro do Senado. O PMDB, o maior partido do Congresso, apesar de contar com o vice-presidente Michel Temer, está cada dia mais desconfiado em relação às intenções do governo. “É preciso reconstruir as pontes, que estão dilaceradas”, diz o deputado petista José Guimarães (CE). Apenas na quinta-feira o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, telefonou ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB), para falar em “reabrir o diálogo”.
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Dilma terá de melhorar os canais com os congressistas. No primeiro mandato, ela não contou com uma retaguarda eficiente, no Palácio do Planalto, para a interlocução política. Num primeiro momento, teve, na Casa Civil e no Ministério das Relações Institucionais, o auxílio do deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), da ex-senadora Ideli Salvatti (PT-SC) e da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Todos eram desprezados pelos parlamentares por ter pouca autonomia. A situação não melhorou com a configuração de hoje. O ministro das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, embora respeitado no Congresso, é considerado pouco conciliador. Apesar de ter sido parlamentar por 20 anos, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, tem poucos amigos no Congresso.

As dificuldades não seriam tão grandes se Dilma não tivesse pela frente duas CPIs que investigam casos de corrupção na Petrobras. As CPIs são controladas por governistas, mas o Congresso está conflagrado por causa das revelações do ex-diretor Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef sobre o esquema que drenou dinheiro público para PP, PT e PMDB. As duas CPIs podem ser encerradas ao final deste ano, mas parlamentares da oposição já trabalham para ter assinaturas suficientes para abrir uma nova em 2015, pois as revelações sobre a corrupção na Petrobras continuarão a brotar na Justiça. Nesse caso, não há ideia de plebiscito – ou mesmo de diálogo – que seja capaz de contornar as dificuldades do governo.

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