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2 de abril de 2015

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Whey protein, o combustível da dieta das malhadoras

O suplemento à base da proteína do leite está ajudando a esculpir o corpo de quem frequenta a academia

JÚLIA KORTE


Karina Bacchi (Foto: Julia Rodrigues/ÉPOCA)
Karina Bacchi (Foto: reprodução)
Assim que acorda, Karina Bacchi, de 38 anos, prepara, como qualquer pessoa comum, seu café da manhã: um copo de suco verde (maçã ou abacaxi, gengibre, hortelã, limão e couve), uma panqueca com duas claras de ovo (gemas não têm serventia), uma banana pequena e, para abrilhantar a refeição, proteína em pó à base de soro do leite, conhecida por seu nome gringo (whey protein). Essa singela refeição matinal tem a quantidade deproteínas encontradas em dois bifes de alcatra de 200 gramas. Isso quer dizer que Karina praticamente almoça quando acorda. E é apenas a primeira de muitas refeições bombadas de proteína. Nelas, haja whey.
Karina é quase um monstro, como se autodenominam as pessoas que comem da forma como ela come e se exercitam da forma como faz – com voracidade, disciplina e bem mais que um grama de exagero. A combinação de dieta e malhação pesada tem um objetivo: obter umcorpo definido e musculoso. Ao contrário da estética lânguida e famélica das passarelas, procura-se uma beleza quase viril, em que a rigidez dos músculos e a definição dos contornos são essenciais. Para virar monstro, Karina treina seis vezes por semana e se alimenta à base de grãos, arroz integral, frutas e proteínas magras.
“É muito melhor do que estar magra, mole, comendo pouco e desanimada”, diz Karina. Após os treinos, ela ingere, claro, (shake de) whey. “Os suplementos leves são grandes aliados para quem pratica exercícios físicos e para a musculatura. Já fui adepta de fechar a boca, passar fome e ficar infeliz. Mas o resultado era magreza e problemas de saúde.”
A demanda para comidas enriquecidas por proteínas explodiu há cinco anos, especialmente nos Estados Unidos e na Inglaterra, e, rapidamente, chegou ao Brasil. Segundo a Associação Brasileira dos Fabricantes de Suplementos, o faturamento com esse tipo de produto passou de R$ 150 milhões, em 2008, para R$ 600 milhões, em 2012, com média de crescimento de 15% anuais. Mundialmente, estipula-se um mercado de R$ 80 bilhões. “A chegada de blogueiras fitness que dão dicas em redes sociais deu acesso aos alimentos funcionais para os não praticantes de academia”, diz Luciana Rocha, educadora física e diretora da Well Be, especializada em bufê funcional, que costuma incluir muita proteína.
Hoje, 25% dos brasileiros usam algum tipo de suplemento ou vitamina e 8% tomam diariamente whey protein ou consomem outro tipo de proteína comum entre os malhadores: a creatina. Um reflexo do sucesso desse tipo de alimentação é o Fábrica de Monstros, canal do YouTube com receitas e entrevistas sobre musculação. Com um ano de vida, ele tem vídeos com mais de 2 milhões de visualizações. Entre os maiores sucessos, receitas como sacolé de albumina (outro tipo de proteína), picolé de BCAA (suplemento à base de aminoácidos), panqueca de batata-doce e tortoleta de whey. Os “frangos” e “monstros”, aliás, são apelidos que os apresentadores dão aos espectadores.
Juju Salimeni é monstro. Ela está em dieta rígida há 15 anos. Diz que era muito magrinha, podia até comer pizza e chocolate. Quando decidiu ganhar massa, precisou de rotina regrada. “Sempre cobrei muito de mim. Não tenho nutricionista e faço muita musculação. Se precisar, vou até a 1 hora da manhã na academia”, diz. Ela acorda às 9 horas, toma – oh! – um whey protein, come três minipães integrais sem glúten e pasta de amendoim integral. Se ainda estiver com fome, não pensa duas vezes: cinco claras de ovo em omelete ou cozido. O resto das refeições é basicamente a mesma coisa: frango ou carne vermelha magra com batata-doce e um outro (adivinhe novamente) whey depois do treino. “Quem sai uma vez da dieta sai sempre. Comigo não funciona. Tenho culpa.” Resultado: Juju tem 5,5 milhões de fãs no Facebook – Madonna, só para efeito de comparação, tem 3 milhões. “As fãs se interessam por uma mudança no corpo que mantém a feminilidade. Gosto de mostrar o que faço, mas tem de ter responsabilidade. Se me atrapalhar ou quiser engravidar, mudarei os hábitos.”
A busca pela saúde diminuiu o preconceito contra a musculação"
FERNANDO MARQUES, TREINADOR
Se antes as jovens almejavam o corpo esguio e ossudo das modelos de passarela, que viviam sob água, cenoura e alface-crespa, hoje, com o culto aos corpos tonificados e sarados, há um incentivo para comer e crescer. “A estética e o padrão de beleza mudaram. Antes, a primeira coisa que as meninas falavam ao chegar à academia é que não queriam o braço do (Arnold) Schwarzenegger”, diz Fernando Marques, tricampeão mundial de fisiculturismo e que atua há 20 anos como treinador. “A busca pela saúde diminuiu o preconceito contra a musculação.”
Há quem acredite que isso seja positivo, uma espécie de antídoto contra a ditadura da magreza e seus derivados – a anorexia e a bulimia. Mas será que estamos falando de uma atitude mais positiva em relação ao corpo feminino ou apenas de um novo padrão tão extremo e prejudicial quanto o outro? “Esse é um padrão de beleza tão perigoso quanto a ‘ditadura da magreza’. Há uma prática exagerada de exercícios, uso de anabolizantes e suplementos alimentares em excesso”, afirma a nutricionista Bruna Murta. Para ela, as blogueiras impõem um padrão que pode levar a prejuízos físicos e psicológicos.
Um estudo da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, de 2011, disse que as mulheres que consomem suplementos multivitamínicos morrem mais cedo do que aquelas que não os consomem. Uma outra pesquisa, realizada por Harvard, também nos EUA, apontou o lado positivo. A amostragem de 80 mil mulheres que seguiram dietas de baixo carboidrato (especialmente de fontes vegetais e alimentos altamente proteicos) mostrou que aquelas que usam esse tipo de alimentação têm 30% menos de chances de desenvolver doenças do coração. Uma terceira pesquisa, de Missouri, garante que os que consomem 35 gramas de proteína no café da manhã ganham mudanças hormonais favoráveis.

>> Emagreça dançando
Uma rápida busca por temas de fitness nas redes sociais leva a um mar de selfies de academia, treinos e poses de biquíni. As hashtags mais comuns são #foconadieta, #chorabacon, #projetotrincada. “As blogueiras podem ajudar se postarem informações relacionadas à autoestima e aconselharem o público sobre a importância de buscar um profissional de saúde para prescrições nutricionais adequadas”, diz a nutricionista Bruna Murta. “O problema é que muitos blogs postam sugestões de cardápio, suplementos, medicamentos e orientações que todos seguem, quando, na verdade, essas informações deveriam ser individualizadas. Isso pode levar a desequilíbrios nutricionais.”
Daniela Berdusco, de 24 anos, é um exemplo da turma whey. Formada em educação física, ela decidiu profissionalizar o hobby atuando como personal trainer. Treina de cinco a sete horas por dia. “Acompanho as rotinas e os hábitos saudáveis das blogueiras e entendo melhor os modismos que minhas alunas me trazem.” O segredo para dar boas aulas, diz, é participar. Para isso, levanta todos os dias às 5h30. A energia vem das refeições realizadas a cada duas horas. Almoço com carne branca e arroz integral. Farinha branca ou gordura? “Nunca”, afirma. Isotônicos e barrinhas proteicas também são permitidos. No jantar, só legumes, salada e chá. “Esse rigor com o corpo não é mais coisa de neurótica.”
Daniela Berdusco (Foto: Julia Rodrigues/ÉPOCA)
Daniela Berdusco (Foto: reprodução)
Façam ou não exercícios, as pessoas precisam de proteínas em sua dieta. AOrganização Mundial da Saúderecomenda que a ingestão seja de 10% a 15% do valor energético total. Alimentos enriquecidos, como o incensado whey, podem ser utilizados para o ganho de massa muscular, mas com parcimônia. “Para pessoas que fazem pouco exercício, o ideal é usar só os alimentos como fonte. Proteína em excesso é prejudicial. Pode levar a cálculo renal”, diz Márcia Nacif Pinheiro, professora de nutrição da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ela acredita que a influência das celebridades nas redes sociais pode levar à vigorexia, transtorno que se caracteriza por insatisfação persistente com o próprio corpo. Também apelidada de síndrome de Adônis, referência mitológica ao ideal de beleza masculina, ela acomete mais os homens entre 18 e 35 anos, mas há mulheres que já desenvolvem esse transtorno. “São pessoas que ficam na academia o dia inteiro. O culto exagerado ao corpo não é positivo.”
Ficar com um corpão desses exige tempo, disciplina e dinheiro – um pote de whey protein com pouco mais de 2 quilos custa cerca de R$ 400. Se for esforço demais, a alternativa é relaxar o corpo vadio em brigadeiro de colher e coxinhas recheadas de catupiry. Sem whey.
Como é a despensa de um monstro (Foto: ThinkStock)

Como é a despensa de um monstro (Foto: ThinkStock)

Como é a despensa de um monstro (Foto: ThinkStock)

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