Cantor da Bósnia faz ponte entre Oriente e Ocidente em 'Salve Jorge'
Goran Bregovic embala cenas com misturas de sons da Europa e da Ásia.
Autor de ‘Mashala mashala’ e outras é ídolo de Iggy Pop e Zach, do Beirut.
O músico Goran Bregovic (Foto: Divulgação)
“Minha música vem daquela terrível fronteira onde por séculos os católicos, cristãos ortodoxos e muçulmanos guerreiam e vivem juntos”, diz Goran Bregovic em entrevista . Ele nasceu em Sarajevo, na ex-Iugoslávia, hoje Bósnia-Herzegovina, onde a guerra que aconteceu na região dos Balcãs de 1992 a 1995 matou cerca de 100 mil pessoas. A mistura musical inclui “ecos de casamentos judeus e ciganos, cantos da igreja Católica e Ortodoxa, música muçulmana”, cita ele.
O músico nascido na Bósnia, de 63 anos, já gravou com o roqueiro Iggy Pop e a finada cantora de Cabo Verde Cesaria Évora. O americano Zach Condon cita a música de Goran como uma das responsáveis por sua paixão por música balcânica, que resultou no incensado codinome indie Beirut. Goran já fez shows com sua “banda para casamentos e funerais” no Brasil, com elogios da crítica e público especializado, mas sem audiência massiva.
Goran Bregovic (Foto: Divulgação/N Babic)
Brega, seu apelido entre fãs, principalmente na Europa, não tem nada a ver com o sentido da palavra em português. A música de Goran já embalou cenas de outras obras, como dos filmes “Borat - O segundo melhor repórter do glorioso país Cazaquistão viaja à América” e "Arizona Dream - Um sonho americano". Sobre as cenas da novela “Salve Jorge” enviadas por e-mail para que o artista conhecesse, Goran tem um comentário bem direto: “As atrizes são belíssimas”.
- Há muito interesse por sua música atualmente no Brasil por causa das canções tocadas na novela “Salve Jorge”. Como você se apresentaria ao brasileiro que não o conhece?
Goran Bregovic - Sou um compositor contemporâneo. Só que minha “contemporaneidade” soa diferente da música de outros compositores atuais. Isso acontece pois nos Balcãs, de onde eu venho, “contemporâneo” é diferente. Quando músicos da minha orquestra leem minhas partituras, eles acham ecos de casamentos judeus e ciganos, cantos da igreja Católica e Ortodoxa, música muçulmana. Minha música vem daquela terrível fronteira onde por séculos os católicos, cristãos ortodoxos e muçulmanos guerreiam e vivem juntos.
- Em que países você já viveu?
Goran Bregovic - Iugoslávia e França. Mas nosso país, aquele que lembramos, aquele que é importante, está dentro da gente. É uma entidade emocional, não uma realidade geográfica. A Iugoslávia hoje é chamada de Bósnia, Sérvia e Croácia [há também Montenegro e Eslovênia], mas três países são muita coisa para mim, então a chamo apenas por seu nome único e velho.
- O que você conhece de música brasileira?
Goran Bregovic - Sei que ela influenciou quase todos os tipos de música do mundo – você não tem que ser um instrumentista para ser tocado pela música brasileira.
- Como foi sua viagem ao Brasil em 2010? Foi sua única vez aqui?
Goran Bregovic - Fui convidado para três shows incríveis em novembro de 1999 em teatro de São Paulo. Fomos também a Porto Alegre, em setembro de 2001, depois voltamos para três shows em 2010. Tocar música no Brasil é como jogar futebol aí... Você tem a impressão de que todo mundo na plateia pode ser melhor que você, ter mais ritmo que você. Você sobe no palco meio apreensivo. Mas eu aproveitei cada minuto.
- Você tem planos de voltar ao país?
Goran Bregovic - Adoraríamos voltar ao Brasil. Uma jovem equipe de produção do Rio de Janeiro propôs uma turnê na primeira metade de setembro de 2013. Vamos ver...
- Como a guerra na Bósnia nos anos 90 afetou sua vida pessoal e sua música?
Goran Bregovic - Como qualquer pessoa de Sarajevo, minha vida é dividida em antes e depois da guerra. Eu tive sorte de estar em Paris, e não em Sarajevo, quando a guerra eclodiu. Por que uma parte tão grande da história da arte é reservada para artistas em exílio?
- Como foi seu contato com Iggy Pop?
Goran Bregovic - É sempre fácil trabalhar com pessoas de muito talento. Gosto de me misturar com vários músicos porque sou uma pessoa eclética. Minha música é eclética. Gosto de trabalhar com músicos ciganos tanto quanto gosto de trabalhar com Iggy Pop ou com a finada Cesaria Evora, com Scott Walker – essas pessoas são minha família musical. Eles marcaram certo tempo e lugar. Quando você junta arquétipos você entende o que eles têm em comum, que passa pelo filtro do tempo. É difícil prever o resultado, mas é um processo do qual gosto muito.
- A biografia em seu site diz que você “brincou de ídolo da juventude em países orientais, até que você enjoou e se cansou disso”. Como você resumiria sua experiência com o Bijelo Dugme [banda de rock na ex-Iugoslávia]?
Goran Bregovic - O papa Wojtyla [João Paulo II] escreveu poesia quando jovem. Marx escreveu o “Manifesto comunista”. Quando você é jovem, até a roupa mais feia te veste bem. Acho que acontece como naquele provérbio: “Quando prostitutas se casam, elas se se tornam as melhores esposas”.
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