Congelar óvulos para adiar a gravidez traz
riscos
Simone Cunha e Thaís Macena
Do UOL, em São Paulo
Do UOL, em São Paulo
- Arquivo PessoalCom 41 anos, a dentista Renata Augusto Amad resolveu congelar seus óvulos
O congelamento de óvulos vem sendo colocado como alternativa para a mulher que, por razões profissionais, afetivas e mesmo de saúde, adia a maternidade. Apesar de um recurso válido e moderno, antes de se decidir por ele, é preciso ter em mente que o procedimento não é isento de riscos.
De acordo com Caio Parente Barbosa, presidente do Instituto Ideia Fértil e professor responsável pelo setor de genética e reprodução humana da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), a técnica é indicada para mulheres que não tiveram filhos até os 35 anos, mas pretendem tê-los. A partir dessa faixa etária, a quantidade de óvulos vai diminuindo gradativamente.
Na prática, o congelamento de óvulos (vitrificação) funciona de forma bem simples. As pacientes são submetidas à indução da ovulação por, aproximadamente, dez dias. Nesse período, recebem hormônios, geralmente aplicados de forma subcutânea. "Normalmente, a mulher libera apenas um óvulo por ciclo menstrual. A indução é necessária para que haja liberação de mais óvulos", diz Barbosa. Nesse período, são realizadas ultrassonografias para acompanhar a resposta ovariana ao estímulo hormonal.
Mas esse não é um procedimento totalmente isento de risco. Existe a possibilidade da chamada síndrome da hiperestimulação ovariana: o alto nível de hormônios na circulação pode provocar um inchaço dos ovários, com vazamento de líquido para o abdômen. Em casos mais graves, a intervenção pode levar à morte.
No entanto, segundo Paula Fettback, médica do Centro de Reprodução Humana Mário Covas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, a introdução de novas medicações tem feito com que os riscos se tornem cada vez mais raros. "A síndrome ocorre em menos de 1% dos casos", diz o médico Marcello Valle, especialista em reprodução humana pela Universidade de Paris.
No entanto, segundo Paula Fettback, médica do Centro de Reprodução Humana Mário Covas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, a introdução de novas medicações tem feito com que os riscos se tornem cada vez mais raros. "A síndrome ocorre em menos de 1% dos casos", diz o médico Marcello Valle, especialista em reprodução humana pela Universidade de Paris.
Após a indução da ovulação, é realizada a coleta dos óvulos. "Trata-se de uma técnica cirúrgica minimamente invasiva, na qual os folículos ovarianos (onde estão os óvulos) são aspirados com uma agulha guiada por ultrassom transvaginal. A paciente passa pelo procedimento sedada", declara Paula.
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Também nessa etapa do tratamento a mulher deve considerar a existência de riscos. Ainda que rara, há a possibilidade de perfuração de algum órgão. "Alguns trabalhos científicos relatam lesões em órgãos pélvicos, em menos de 0,5% das punções aspirativas de óvulos", afirma o professor da Faculdade de Medicina do ABC.
Na sequência, os óvulos são analisados em laboratório: eles serão congelados apenas se estiverem com qualidade e maturidade adequadas. De acordo com Valle, em geral, cerca de 70% a 80% do total têm potencial de fertilização, podendo ser congelados. "O ideal é congelar, em média, dez óvulos. Para cada dez, há uma chance de gravidez", diz Barbosa.
Depoimentos
A psicóloga e professora universitária Eliane Pimenta, 37 anos, decidiu, no início deste ano, realizar o congelamento de óvulos. "Como desejo ser mãe e, no momento, tenho outras prioridades, resolvi congelar para ter a opção de aguardar mais um pouco. Mesmo que eu não venha a usar os óvulos e engravide de forma natural, foi uma maneira de controlar a ansiedade", diz.
Já a cirurgiã-dentista Renata Augusto Amad, 43, recorreu à técnica há dois anos. "De repente, percebi que o tempo havia voado. Com 14 anos de casamento, entrei em uma crise pessoal, questionando vários aspectos da vida", conta. O marido fez vasectomia irreversível, pois já tem filhos do primeiro casamento, mas ela começou a se dar conta de que, talvez, quisesse ter um filho.
Segundo Renata, a decisão de realizar o procedimento surgiu para ter tempo de analisar com calma os projetos que ela tem para o futuro. "Preciso ter certeza do que eu quero antes de dar esse passo. E, para não ter de agir às pressas, sem pensar, adotei o recurso", afirma.
Recurso não garante a gravidez
Vale ressaltar que, mesmo com o congelamento de óvulos, não há garantia absoluta de gestação, embora a técnica venha se mostrando cada vez mais segura e eficiente.
"Vários trabalhos científicos apontam que a taxa de gravidez com óvulos vitrificados e descongelados é a mesma de ciclos de fertilização in vitro (FIV) a fresco. Portanto, existe uma relativa certeza de que essa paciente poderá ter um filho", diz o ginecologista Joji Ueno, responsável pelo setor de Histeroscopia Ambulatorial do Hospital Sírio Libanês, também na capital paulista.
Segundo Paula, as chances dependem muito da idade de quem recorre ao congelamento, da qualidade e da quantidade dos óvulos captados.
Uma vez feito o congelamento, a mulher pode optar por utilizá-los a qualquer tempo. Porém, a fertilização é sempre in vitro. "Os óvulos são descongelados e inseminados com o espermatozoide do companheiro. Então, formam-se os embriões, que serão transferidos para o útero da mulher", explica Valle. Essa primeira tentativa tem custo semelhante a um tratamento de FIV com óvulos frescos (entre R$ 13 mil e 20 mil).
Para Maria Clara Silva, 36, advogada, a decisão de realizar a vitrificação de óvulos aconteceu há três meses. "De repente, me deu um estalo. Sempre quis ser mãe, mas, nesse momento, não estou em um relacionamento sério. Então, resolvi congelar os óvulos enquanto tenho uma condição saudável, para poder ter filhos quando for possível. Isso me dá uma tranquilidade. Se eu encontrar alguém daqui a uns dois anos, posso tentar primeiro o método natural. Vou deixar a técnica de reprodução assistida como segunda opção, mas já é uma garantia", diz.
Congelamento pode ser feito pelo SUS
O congelamento de óvulos também é bastante utilizado por mulheres que, por motivos de saúde, precisam adiar a maternidade. "Pacientes que precisam ser submetidas a tratamentos oncológicos, como quimioterapia e radioterapia, que podem comprometer temporariamente ou definitivamente a capacidade reprodutiva, podem valer-se do recurso", afirma Barbosa, da Faculdade de Medicina do ABC.
Toda paciente que se submete a essas terapias corre o risco de ter a sua reserva ovariana ameaçada, pois o medicamento quimioterápico age com o intuito de destruir as células do tumor. "No entanto, esse tratamento também pode matar as células sadias, entre elas, os óvulos. Por isso, o ideal é fazer o congelamento antes de iniciar a quimioterapia", diz Valle.
O método também é particularmente indicado para pacientes que serão submetidas a cirurgias ginecológicas ou pacientes com histórico familiar de menopausa precoce.
A contadora Tatiane Pacheco Roma, 25, passou pelo procedimento para preservar os óvulos, em 2011, antes de enfrentar um tratamento devido ao câncer de mama. "Precisei fazer quimioterapia, o que poderia me deixar estéril. Na época, tive receio de não conseguir realizar o congelamento de óvulos devido ao custo financeiro. Além disso, não tinha muito tempo hábil antes de iniciar o tratamento", lembra.
A saída foi recorrer ao SUS (Sistema Único de Saúde) e a iniciativa deu certo: Tatiane conseguiu fazer o procedimento, com sucesso, no Hospital Pérola Byington, em São Paulo, sem custo algum.
O Instituto Ideia Fértil, vinculado ao Serviço de Genética e Reprodução Humana da Faculdade de Medicina do ABC, também conta com um programa gratuito de congelamento de óvulos e fragmentos de ovários, voltado às mulheres que vão iniciar quimioterapia e que correm risco de perder a fertilidade. "O objetivo é que, após o tratamento do câncer, elas possam realizar o sonho de se tornarem mães", afirma Barbosa.
Em clínicas particulares, o congelamento custa, em média, R$ 10 mil. "O valor é calculado por ciclo de congelamento, dependendo das medicações utilizadas, as quais variam de acordo com a reserva ovariana e a idade da paciente", fala Paula. Já a taxa de conservação do material colhido sai por, aproximadamente, R$ 1.000 ao ano. "Para mim, o investimento valeu a pena. Fiz meu tratamento oncológico bem mais tranquila sabendo que havia congelado alguns óvulos", conta Daniela *, 34, empresária, que preferiu não ser identificada pelo sobrenome. Há três anos, ela foi diagnosticada com um tumor maligno na mama. "Estava recém-casada e sempre sonhei em ter filhos. Por isso, recorri ao congelamento."
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