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29 de novembro de 2014

O Museu do Amanhã mostrará como será o mundo 50 anos à frente

O primeiro museu de ciência atualizável do país será inaugurado ano que vem, no Rio de Janeiro

MARCELO BORTOLOTI
SEMPRE ATUAL Imagem de como deverá ser o Museu  do Amanhã. Será  o primeiro museu de ciência atualizável do país (Foto: Divulgação)
Museus de ciências e tecnologia cumprem um papel educativo fundamental ao tentar oferecer um vislumbre do futuro. Ao fazer isso, apresentam alertas sobre grandes problemas, despertam a curiosidade para questões intrigantes e informam o visitante sobre as possibilidades excitantes que a humanidade mal começa a explorar. Ao fazer isso, correm também risco de envelhecer mal, por causa da rapidez com que mudam  nossas concepções de futuro. Só que isso é passado. O presente pertence aos museus interativos, multimídia, com acervo digital. Eles podem ser atualizados, como qualquer software ou aplicativo. Faz parte dessa família, no Brasil, o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo. O primeiro museu desse tipo a tratar de ciência e tecnologia no país será o Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, com inauguração prevista para até junho de 2015. Ele fará parte de um restrito circuito de museus ultratecnológicos dedicados à ciência e à tecnologia, como a Academia de Ciências da Califórnia, nos Estados Unidos, o Kolkata, na Índia, e o Museu Nacional de Ciência e Tecnologia de Taiwan.
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O Museu do Amanhã será instalado num prédio de visual surpreendente, desenhado pelo espanhol Santiago Calatrava, um dos arquitetos mais badalados do mundo. É uma iniciativa da prefeitura do Rio e da Fundação Roberto Marinho, ligada ao Grupo Globo, que publica ÉPOCA. O edifício de formato alongado e partes metálicas móveis começou a ser erguido em 2011, numa plataforma que se projeta para o mar na Baía de Guanabara. Seu conteúdo inclui apenas instalações interativas e nenhum objeto. Idealizado como parte do projeto de renovação da área portuá­ria do Rio, o museu se propõe a refletir sobre o mundo 50 anos à frente. Isso não quer dizer 2065. Quer dizer sempre 50 anos à frente do momento da visita. Será o primeiro museu no Brasil com acervo atualizado em tempo real. Por isso, ele tem acordos com 80 entidades científicas brasileiras e internacionais, como o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Elas fornecerão dados atualizados para calibrar o acervo. A atualização poderá ser diária.

Um exemplo simples das dificuldades de refletir sobre o futuro é o aquecimento global. Acredita-se hoje, com 95% de segurança, que a temperatura média do planeta subirá nas próximas décadas. Por esse mesmo modelo, porém, há 2% de chance de a temperatura média cair. Esse efeito desencadearia o início de uma nova Era do Gelo. O futuro é de aquecimento ou esfriamento? Seja qual for, ele será mostrado no museu. “A única certeza sobre o futuro é que o inesperado acontecerá. Era a grande dificuldade conceitual do Museu do Amanhã”, diz o curador Luiz Alberto Oliveira, pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas.
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Duas ideias foram centrais para a criação do museu. A primeira é o imponderável – a certeza de que o futuro não permite certezas e sempre nos surpreenderá. A outra é aceitar que estamos no período antropoceno, termo criado pelo químico holandês Paul Crutzen. Ele designa uma nova era geo­lógica, em que a humanidade é o fator novo, ao lado das forças naturais que sempre estiveram presentes na história do planeta. “Os efeitos de nossa presença se tornaram uma força geológica”, diz Oliveira. “Daqui em diante, viveremos num planeta profundamente transformado por nossa atuação.”Além de abrangentes, as transformações provocadas pelo ser humano se mostram extremamente duradouras. As bombas atômicas detonadas no planeta num período de cinco décadas, a partir dos anos 1940, espalharam pelo globo partículas de plutônio que podem levar 24 mil anos para desaparecer. O consumo de petróleo, a extinção de espécies e as emissões de gases provocam efeitos que serão detectáveis no futuro longínquo.

EFEITOS Concepção artística do  Museu do Amanhã. Ele tratará dos efeitos da humanidade  sobre o planeta (Foto: Divulgação)
Serão apresentados, no museu, seis aspectos do futuro – clima, cobertura vegetal e biodiversidade, demografia, longevidade, cidades e a interação entre humanos e tecnologia. Algumas tendências já são bastante conhecidas e discutidas. A proposta do museu é impressionar e tocar o visitante com experiências visuais e interativas. Na seção de clima, serão apresentados cenários mais brandos ou mais agudos, que poderão ocorrer de acordo com o uso da terra, o destino das florestas e o tipo de energia consumida nos próximos anos. Os índices de extinção de espécies serão cada vez mais elevados. Nas seções de demografia e longevidade, o visitante entenderá as consequências de haver, em 2060, cerca de 10 bilhões de pessoas no mundo, a maioria em regiões tropicais pobres. Além da pressão pelo consumo de mais recursos naturais, a explosão demográfica aumentará as diferenças entre ricos e pobres. O aumento da longevidade também terá impacto sobre o estilo de vida de todos. Hoje, passamos um terço da vida nos formando, um terço no trabalho e o último terço na aposentadoria. Com indivíduos cada vez mais velhos, alguns atingindo 150 anos de idade, seremos obrigados a mudar isso. Teremos de estudar constantemente, para nos atualizarmos diante de uma cultura e de uma tecnologia que avançam em ritmo acelerado. Não poderemos parar de trabalhar até o final da vida, intercalando os períodos de descanso e retiro ao longo da carreira profissional. Nesse período, 70% da população mundial passará a viver em cidades. Elas serão a base da expansão do conhecimento e da inovação. Com isso, as taxas de escolaridade deverão aumentar em toda a população. Máquinas poderão conversar, aprender e entender metáforas e contexto. Aparelhos eletrônicos que ampliam as capacidades do corpo humano se difundirão. Alguns aparelhos, como os equipamentos de comunicação, serão acoplados ao corpo dos interessados. Circuitos eletrônicos poderão ser tatua­dos na pele e usarão bioeletricidade como fonte de energia.
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O museu aproveitará uma outra vantagem das instalações multimídias e interativas. Ele atenderá à curiosidade dos adultos já bem informados sobre os assuntos e, ao mesmo tempo, será acessível para crianças de 8 anos de idade que entrem em contato com os temas pela primeira vez. Num mesmo ponto da exposição, cada interessado poderá mergulhar com a profundidade que desejar nos dados disponíveis. O objetivo do percurso é mostrar, com informação científica de alta qualidade, que o futuro não é necessariamente sombrio nem róseo. Ele depende fundamentalmente das decisões que tomamos hoje.

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