Ao Vivo

30 de setembro de 2014

Por que os manifestantes de Hong Kong protestam com guarda-chuvas

A população de Hong Kong foi às ruas protestar contra o governo central chinês. Em jogo, o temor de que as liberdades vividas pela ilha desapareçam sob o autoritarismo de Pequim

REDAÇÃO ÉPOCA
Manifestantes se reúnem diante dos prédios que compõem a administração de Hong Kong, na noite de segunda (29) para terça. A repressão policial do final de semana atraiu mais pessoas para as ruas (Foto: Getty Images)
 
Protesto não é novidade em Hong Kong. Localizada no Mar da China Meridional, Hong Kong é uma cidade moderna. Transferida para administração de Pequim em 1997, depois de anos sob domínio inglês, a metrópole, famosa por seus arranha-céus, estava acostumada a protestos e altercações. Por lei, seus habitantes são autorizados a desafiar o governo abertamente, algo incomum em território chinês. Mesmo assim, os protestos costumam ser pacíficos, restritos a um dado local e terminam logo.

Não foi assim na última sexta-feira (26). Naquela data, um protesto iniciado diante da sede do governo dias antes cruzou a madrugada. No sábado (27) e domingo (28) a polícia da cidade reagiu. Respondeu com bombas de gás lacrimogêneo e gás pimenta. A ação dos policiais não intimidou quem foi às ruas. A violência policial atípica aumentou o número de manifestantes que, nesta segunda-feira (29), se espalharam por diferentes áreas do centro financeiro.

>>Na ONU, Dilma pede mais espaço para países em desenvolvimento
A revolução dos guarda-chuvas (Foto: Reprodução/ Instagram)
As manifestações começaram na quarta-feira, com demonstrações de estudantes nas ruas. Eles protestavam, pacificamente, contra os planos do governo central para as eleições em Hong Kong em 2017. Paralelamente, um grupo de manifestantes pró-democracia intitulado Occupy Central marcou, na sexta-feira, um “ato de desobediência civil” para a quarta-feira seguinte, dia 01 de outubro. A data marca o aniversário de criação da China Comunista.

Com os protestos tomando corpo, decidiram tomar as ruas de imediato.  Fortalecidas, as manifestações engrossaram ao longo do final de semana e se espalharam pelas redes sociais sob as hashtags #OccupyCentral e #HKDemocracy. “Central” é como os moradores  chamam a região central da cidade. O governo chinês respondeu bloqueando o Instagram no restante do país, tentando evitar que as notícias sobre os protestos se espalhassem . As fotos de manifestantes carregando guarda-chuvas para se proteger do gás pimenta se espalharam pelo mundo e deram nome aos protestos: a “revolução dos guarda-chuvas”. As imagens do vídeo abaixo mostram as ruas da cidade tomadas por manifestantes no domingo (28):

>>A volta dos EUA ao atoleiro do Oriente Médio

Os moradores de Hong Kong protestam contra o temor de que a cidade – um território especial administrado pelo governo central chinês- perca as garantias democráticas de que ainda se vale. Miram as eleições de 2017. Em agosto, o governo chinês restringiu as regras para quem pode se candidatar: nas eleições, segundo as novas normas, os moradores de Hong Kong só poderão votar em uma lista de candidatos pré-aprovados pelo Partido Comunista Chinês.

Pequim bloqueou o Instagram para evitar que imagens como essa, populares na rede, se espalhassem pelo país (Foto: Reprodução/ Instagram)
O governo chinês não parece disposto a desistir de sua decisão.  A força empregada pela polícia na repressão dos protestos – considerada “sem precedentes” pela organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Monitor - foi aprovada por Pequim, que pediu a nações estrangeiras que “não apoiem atos de desobediência civil” observados na cidade. Segundo a agência de notícias EFE,  Carrie Lam, a segunda no comando, considera pouco “realista” que as autoridades chinesas desistam da reforma política que pretendem realizar.
A razão para essa descrença tem nome: Xi Jinping. Líder do Partido Comunista Chinês desde 2012, ele era o responsável pelas políticas relativas à Hong Kong antes de assumir o cargo. Segundo James Miles, o editor para a China da revista britânica The Economist, não deve tolerar uma derrota nesse território. “Trata-se da maior manifestação de rua que a China enfrenta desde os protestos da Praça da Paz Celestial em 1989”, disse Miles à CNN. Segundo a The Economist, Xi Jinping não quer nada que se assemelhe a uma democracia ocidental florescendo em Hong Kong.

Nesse meio tempo, legisladores pró-democracia no interior da cidade anunciaram, nesta segunda-feira (29) que preparam uma minuta legislativa pedindo pela saído do atual chefe-executivo da cidade, Cy Leung. Eles o responsabilizam pela escalada da violência policial vivida durante o final de semana.

As raízes do atual protesto remontam a 1997, quando Hong Kong foi devolvida à China depois de passar 150 anos sob domínio britânico. Nesse período, a cidade se tornou um importante polo financeiro asiático, e seus habitantes usufruíram de maior liberdade política que o restante da China. Ao assumir controle sobre o território, o governo chinês prometeu que seus habitantes poderiam escolher sua principal autoridade, o chefe-executivo, por meio de eleições diretas pela primeira vez em 2017. Segundo o site Vox, o novo plano apontado em agosto, de restringir os candidatos em quem os habitantes poderão votar, soou para muitos como uma quebra desse compromisso.

Em Hong Kong, fica a dúvida se essa é uma restrição pontual ou a primeira de futuras medidas para cercear as liberdades experimentadas na região. Segundo a The Economist, uma foto de um manifestante solitário, carregando um guarda-chuva entre nuvens de fumaça, circulou o mundo, ecoando a famosa imagem do estudante diante de tanques de guerra na Praça da Paz Celestial. Em Hong Kong, o massacre de 1989 em Pequim é relembrado em vigílias anuais, algo proibido no restante da China. Os atuais manifestantes erguem seus guarda-chuva para se proteger do gás dos policiais chineses. E para, quem sabe, garantir um futuro mais livre.
RC

Nenhum comentário:

Postar um comentário